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sábado, 3 de dezembro de 2005

Ver, vendo...

 Quantas vezes passei por locais maravilhosos e não me dei conta de suas existências...
Quantas vezes disse: Bom Dia! e não olhei os olhos a quem cumprimentava...
Quantas vezes as oportunidades bateram à minha porta e eu deixei de aproveitá-las, 
de lhes dar o devido valor, por estar preocupado com um amanhã material,
que poderia ou não se concretizar, esquecendo do agora, do olhar em volta,
do sentir o cheiro das coisas...
Do ter prazer em olhar o brilho da lua a reflectir o sol... 
Da alegria do sorriso de uma criança - honesto, simples e verdadeiro

ao ganhar uma palavra de amor e de carinho...
Dei-me conta do que estou perdendo por me preocupar tanto...
Do querer viver hoje um amanhã que não me pertence...
Dei-me conta de que preciso olhar e ver...
"Ver Vendo"...
De tanto ver, a gente banaliza o olhar...
Vê não-vendo...
Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver...
Parece fácil, mas não é...
O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade...
O campo visual da nossa rotina é como um vazio...
Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta...
Se alguém lhe perguntar o que você vê no seu caminho, você não sabe...
De tanto ver, você não vê...
Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio de seu escritório...
Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro...
Dava-lhe um bom dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência...
Um dia, o porteiro cometeu a descortesia de falecer
Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia?
Não fazia a mínima ideia...
Em 32 anos, nunca o viu...
Para ser notado, o porteiro teve que morrer...
Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo a rotina, pode ser que também ninguém desse por sua ausência...O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem...Mas há sempre o que ver....
Gente, coisas, bichos...
E vemos? Não, não vemos...
Uma criança vê o que um adulto não vê...
Tem olhos atentos e limpos para o espectáculo do mundo.
O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de tão visto, ninguém vê...
Há pai que nunca viu o próprio filho...
Marido que nunca viu a própria mulher
(e desconhece os seus segredos e desejos),

Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos...
É por aí que se instala no coração o
monstro da indiferença...
Otto Lara Rezende

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