Dra. Victoria Braithwaite fala sobre senciência animal
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Em entrevista à comissão do Prêmio WSPA de Bem-estar Animal 2010, a bióloga Dra. Victoria Braithwaite, renomada pesquisadora da universidade americana Penn State University, falou sobre senciência animal. Formada pela Universidade de Oxford e com PhD na mesma instituição, publicou vários trabalhos sobre senciência em peixes e recentemente lançou um livro-texto sobre o tema. Sua área de estudos envolve a análise da percepção, do aprendizado e da memória dos animais.
- O que significa senciência?
VB: Senciência significa ter a capacidade de vivenciar sentimentos e emoções. Como tal, significa ter a capacidade de sentir dor e de sofrer, mas o oposto também é verdadeiro – um animal senciente também tem a capacidade de sentir prazer.
- Você poderia contar um pouco sobre a história do estudo da senciência animal?
VB: Por um longo tempo se pensou que senciência fosse um processo exclusivo dos seres humanos, e muitas pessoas a desconsideravam para os animais. Teorias extremas, tais como aquelas propostas por René Descartes no século XVII, tiveram um efeito profundo e prolongado. Essas opiniões consideravam os animais como máquinas ou autômatos, incapazes de ter sentimentos ou emoções. Entretanto, durante o século XX, e agora adentrando o XXI, esse conceito está mudando, de forma que hoje se acredita amplamente que muitas espécies, além dos vertebrados, também são sencientes.
- Quais são as principais evidências da senciência animal?
VB: A senciência é um processo difícil de ser demonstrado porque seria preciso entrar na mente de um animal para entender o que ele está percebendo e processando, e como tal processo cognitivo altera o comportamento do animal. Porém, pesquisas recentes (nos últimos cinco anos) começaram a mostrar excelentes indícios que os animais apresentam estados afetivos. Essas evidências apontam que várias espécies de vertebrados podem sentir prazer ou sofrer.
Acredito que algumas das evidências mais convincentes são aquelas provenientes do trabalho realizado pelo Professor Mike Mendl e seus colaboradores. Eles demonstraram que a retirada de enriquecimento ambiental das gaiolas onde os ratos de laboratório estão alojados abala o estado afetivo dos animais, resultando em um aspecto pessimista/depressivo. Os ratos tornam-se menos dispostos a generalizar entre estímulos ambíguos, ou seja, tendem a interpretar um estímulo duvidoso como não sendo positivo. O que, em comparação, os ratos mantidos com enriquecimento ambiental farão. Os animais que passaram pela perda de enriquecimento tornam-se muito mais conservadores nas escolhas que fazem.
- Considerando-se o Reino Animal, quais grupos de animais são sencientes?
VB: Até o momento, há boas evidências de que animais vertebrados têm alguma forma ou capacidade de sentir. Quanto mais complexo for o sistema nervoso, mais avançadas serão as formas de senciência – assim, enquanto peixes apresentam formas bastante básicas de emoções e sentimentos, os mamíferos parecem equipados com capacidades de sentir mais complexas e variadas.
Este não é o caso de invertebrados. Acredito que não dispomos de evidências convincentes da senciência em invertebrados – mesmo para polvos e lulas, que são considerados os invertebrados mais inteligentes. Talvez encontremos melhores formas de testar isso no futuro, mas neste momento não há indícios convincentes.
- Qual é o impacto do reconhecimento dos animais como seres sencientes sobre a produção animal?
VB: O reconhecimento da senciência dos animais de produção vem tendo um grande impacto. Grande parte da sociedade acredita que tem uma obrigação ética de cuidar dos animais que mantemos em cativeiro com o propósito de produção de alimentos ou outros produtos. Dada a evidência de esses animais podem sofrer medo ou dor, existe um interesse crescente em melhorias nas instalações, no manejo e nos cuidados que os animais de produção recebem.
- Na sua opinião, qual será a reação da sociedade à medida que o reconhecimento da senciência se torna mais evidente?
VB: À medida que a sociedade se torna mais consciente da senciência animal, haverá um interesse crescente nos métodos de produção comumente empregados. Isso levará a um aumento na atenção dada ao bem-estar animal. Minha expectativa é de que haja um impacto positivo na forma de alojamento, manejo, cuidados e, finalmente, de abate ou descarte dos animais. Talvez a sociedade precise considerar pagar mais por animais criados com bem-estar. A partir de uma perspectiva ética, a sociedade deveria demonstrar motivação para pagar tal custo, uma vez que é sabido que os animais que utilizamos para produção são seres sencientes.
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