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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

O Ano do Dilúvio

Em O Ano do Dilúvio, Margaret Atwood volta ao cenário pós-apocalíptico da novela Oryx e Crake para explicar como o homem conseguiu dizimar sua espécie. Mais do que uma obra de ficção, O Ano do Dilúvio é um convite à reflexão, uma tentativa, nas palavras da própria autora, de responder às perguntas "o que está acontecendo com o mundo?", "como podemos reverter os danos?", "quanto tempo nos resta?" e "que tipo de pessoa aceitará esse desafio?"
Sombrio, sutil, tocante e muitas vezes hilário, O Ano do Dilúvio é Margaret Atwood em sua essência brilhante e inventiva.

Deixo aqui uma pequena amostra do início do livro:

No início da manhã Toby sobe ao terraço para ver o sol nascer. Ela se equilibra com um esfregão; o elevador está parado faz algum tempo e o excesso de umidade torna os
degraus da escada dos fundos bastante escorregadios, de modo que se ela escorregar não haverá ninguém para ampará-la.

A medida que os primeiros raios de sol despontam, a neblina emerge no meio de uma fileira de árvores entre ela e a cidade abandonada. No ar, um leve cheiro de queimado, de caramelo, alcatrão e molho rançoso de churrasco, e um cheiro esfumaçado e gorduroso de cinzas de lixo esturricado e encharcado após a chuva. Ao longe, as torres abandonadas parecem um antigo recife de corais - esbranquiçado e descorado, destituído de vida.

Mas ainda há vida. Os pássaros cantam, talvez sejam pardais.

Os pequenos trinados são claramente audíveis sem o rumor do tráfego para abafá-los.

Será que eles percebem a quietude, a ausência de motores? E se percebem, isso os deixa mais felizes? Toby não faz a menor ideia. Ao contrário de outros
jardineiros - mais naturalistas e provavelmente mais exaltados ela nunca teve a ilusão de que podia conversar com os pássaros.

O sol brilha ao leste, avermelhando a névoa azul acinzentada que marca o distante oceano. Os urubus empoleirados nos postes hidráulicos sacodem as asas para enxugá-las, abrindo-as como negros guarda-chuvas. Vez por outra um deles levanta voo e sobrevoa o lugar em círculos. Quando eles dão um súbito mergulho vertical pelo ar, é sinal de que avistaram carniça.

Os urubus são nossos amigos, ensinavam os jardineiros. Eles purificam a terra. Eles são anjos negros de Deus, necessários à dissolução dos corpos. Imaginem como seria terrível se não houvesse a morte!

Toby se pergunta se ainda acredita nisso.
Tudo é diferente quando visto de perto.

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